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PIBIC - 2011/12
A INFLUÊNCIA DE NIETZSCHE SOBRE O ROMANCE “O
LOBO DA ESTEPE” DE HERMANN HESSE
PROJETO DE ORIGEM:
Nietzsche e o “Crepúsculo dos Ídolos”: para uma crítica da cultura – Parte II
SUMÁRIO
1. Introdução e contextualização ............................................................... 1
2. Objetivo ................................................................................................. 3
3. Roteiro de atividades do aluno .............................................................. 3
4. Cronograma .......................................................................................... 4
1. INTRODUÇÃO E CONTEXTUALIZAÇÃO
A influência de algumas teses fundamentais do pensamento de Nietzsche é sumariamente reconhecida na literatura estrangeira do século XX. Uma dessas recepções do pensamento de Nietzsche ocorreu com o escritor Hermann Hesse (1877-1962) que, inclusive, estava na esteira das interpretações sobre a filosofia de Nietzsche no início do século XX, haja vista sua conferência intitulada “Zarathustras Wiederkehr”, de 1919. (Szabó, 2009, p. 150) O primeiro a reconhecer a afinidade entre Nietzsche e Hesse foi seu amigo e biógrafo Hugo Ball, cujo affair começara logo quando o jovem Hesse chegou à Basiléia profundamente influenciado pela estética nietzscheana (Ball, 2008, p. 76).
Não apenas nas atividades acadêmicas é possível encontrar referências de Hesse a Nietzsche, mas inclusive em seus próprios romances, cujos personagens são notoriamente marcados pela leitura de Nietzsche, tal como é o caso de Harry Haller em O lobo da estepe: “Nesse decurso, cada vez mais me convencia de que a enfermidade daquele paciente não provinha de qualquer deficiência de sua natureza, mas, ao contrário, tão-somente da não lograda harmonia entre a riqueza de seus dons e sua força. Convenci-me de que Haller era um gênio do sofrimento; que ele, no sentido de várias acepções de Nietzsche, havia forjado dentro de si uma capacidade de sofrimento genial, ilimitada e terrível.” (Hesse, 1998, p. 15) Um aspecto determinante, além disso, é que precisamente a alusão de Hesse a Nietzsche ocorre sob a influência de uma das principais teses do pensamento de Nietzsche que, no Crepúsculo dos Ídolos, aparece sob a fórmula: “até no ferimento se acha o poder curativo.” (Nietzsche, 2006, p. 7) Trata-se da hipótese sobre a noção de grandeza em Nietzsche, que por sua vez indica como a saúde tem de ser gerada precisamente do padecimento da doença. No texto de Hesse, a “capacidade de sofrimento genial” se origina da “riqueza de seus dons e sua força.” A doença, ou no caso o sofrimento, só é suportado por aquele que está suficientemente sadio, bem como é capaz de incorporar a própria crise como as condições mais adequadas à purificação. Assim é também a hipótese da
jovialidade (Heiterkeit) que, segundo Nietzsche, é oriunda daquele que é capaz de levar às últimas consequências a seriedade (Nietzsche, 2006, p. 57). O conceito fundamental nietzscheano da “grande saúde” (2001, p. 286s) significa a leveza ou jovialidade daquele que atravessou muitas doenças, mas que agora tem debaixo de si forças regenerativas suficientes para afirmar a própria vida.
A noção de “crise” em Nietzsche e Hesse é marcante. Se o primeiro experimenta tal crise no início de 1880 (na metade da sua vida), e tem seus textos marcados por ela – “que virá a ser do pensamento que é submetido à pressão da doença?” (Nietzsche, 2001, p. 11) – o segundo, igualmente, sente no corpo também os sinais de uma crise, daí os intérpretes assinalarem as obras de Hesse a partir de 1919 como marcadas pelo signo da crise (Szabó, 2009, p. 149), como p.ex., Sidarta, um livro antecipatório de O lobo da estepe. Ora, o personagem Harry Haller em O lobo da estepe é justamente alguém que percorre a trajetória que vai da seriedade teórica, num lento e doloroso processo de padecimento com sua crise, até sua “cura” no “teatro mágico”, em que, segundo o romance, Haller se confronta com Mozart que o ensina a habilidade da leveza, do humor, do riso, enfim, da ‘jovialidade’. (Hesse, 1998, p. 216)
A trajetória de Haller, por um lado, é o percurso da superação de uma crise e afirmação da vida, ou ainda, a realização romanesco-literária da fórmula filosófica nietzscheana de que a saúde é originária da doença. Por outro lado, porém, o mesmo processo de crise vivenciado por Haller pode ser equiparado à crise de uma época, ou seja, Hesse utiliza o próprio personagem Haller como semiótica para diagnosticar, simultaneamente, a ruína da cultura (cf. Szabó, 2009, p. 150) Curiosamente, trata-se do mesmo diagnóstico que Nietzsche realizou a propósito do declínio da Bildung, por conta da ruína da jovialidade. O lobo da estepe foi publicado em 1927 no período pós-guerra e, por isso mesmo, a expressão imediata não apenas da superação da crise do seu personagem – que aprende a jovialidade através do padecimento da seriedade –, mas igualmente do
diagnóstico da crise cultural de uma época.
2. OBJETIVO
O objetivo desse plano de trabalho é analisar a influência do pensamento de Nietzsche sobre a literatura estrangeiro do século XX, especialmente no romance O lobo da estepe (1927) de Hermann Hesse, tanto no aspecto existencial quanto na dimensão de diagnóstico da crise da cultura. Os objetivos específicos desse plano de trabalho são: 1) Analisar as estruturas teóricas da fórmula de Nietzsche “até no ferimento se acha o poder curativo”, relacionando às noções de
‘grande saúde’ e ‘jovialidade’; 2) Indicar as dimensões teóricas de aproximação entre Nietzsche e Hesse, especialmente a partir da noção de que a superação de uma crise pressupõe o padecimento da própria doença, através do personagem H. Haller em O lobo da estepe; 3) Explicar em que medida a mesma superação da crise no personagem Haller representa, simultaneamente, o diagnóstico também de uma crise da cultura, ocorrida no período de publicação do romance (que é o pós-guerra).
3. ROTEIRO DE ATIVIDADES DO ALUNO
1. Explicação da relação entre saúde e doença no pensamento de Nietzsche;
2. Análise da noção de ‘grande saúde’ em Nietzsche;
3. Situar teoricamente a noção de ‘grande saúde’ na fórmula de Nietzsche “até no ferimento se acha o poder curativo”, a fim de mostrar qual é a estrutura do conceito de jovialidade;
4. Indicação das estruturas teóricas em O lobo da estepe de Hesse, que recepcionam a fórmula da jovialidade de Nietzsche;
5. Análise da trajetória de Harry Haller como trajetória de superação de uma
crise, tal como a ‘grande saúde’ de Nietzsche;
6. Analisar teoricamente as noções de jovialidade e riso em O lobo da estepe, a fim de indicar a influência direta da reflexão sobre a fórmula de Nietzsche;
7. Relacionar O lobo da estepe com outros romances de H. Hesse, especialmente Sidarta que é um romance preparatório ao lobo da estepe, para indicar como a partir de 1919 vários textos do romancista alemão são marcados pelo signo da necessidade da crise;
8. Mapear nos textos pós 1919, notadamente O lobo da estepe, em que medida ao mesmo tempo em que Hesse indica a superação da crise, aponta também o diagnóstico de uma crise cultural.
4. CRONOGRAMA
Agosto/11 | - Início da 1ª etapa da pesquisa: leitura e fichamento da relação entre saúde e doença nos textos de Nietzsche, sob a forma da metodologia intitulada “interpretação contextual”. |
Setembro/11 | - Análise da noção de ‘grande saúde’ em Nietzsche, a fim de fazer a relação entre esse conceito e a fórmula nietzscheana “até no ferimento se acha o poder curativo”. - leitura e fichamento de O lobo da estepe de Hesse, bem como tradução, junto com o orientador, de artigos sobre a influência de Nietzsche sobre Hesse; - Apresentação dos resultados sobre a relação entre grande saúde e a fórmula de Nietzsche, no Grupo de Pesquisa Nietzsche da PUCPR. |
Outubro/11 | - Investigação da fórmula “até no ferimento se acha o poder curativo” como estrutura do conceito de jovialidade (Heiterkeit), tal como o termo ocorre no Crepúsculo dos Ídolos de Nietzsche; - Preparação de uma comunicação sobre a relação entre a ‘grande saúde’ e jovialidade em Nietzsche para ser apresentada XVI Congresso de Filosofia Moderna e Contemporânea da Unioeste. |
Novembro/11 | - Início da 2ª fase da pesquisa: mapeamento da estrutura teórica da ‘jovialidade’ em Nietzsche presente em O lobo da estepe. - Mostrar em que medida o personagem Harry Haller do romance exprime a trajetória da fórmula nietzscheana ‘até no ferimento se |
acha o poder curativo’. - Apresentação no Grupo de Pesquisa Nietzsche da PUCPR, sobre a relação entre a fórmula de Nietzsche e o personagem Haller de O lobo da estepe. | |
Dezembro/11 | - Reunião com o orientador para definição das outras tarefas. |
Janeiro/12 | - Análise teórica dos conceitos de jovialidade e riso especificamente em O lobo da estepe, a fim de indicar a influência existencial direta e imediata entre Nietzsche e Hesse; - Início da confecção do relatório parcial do Pibic. |
Fevereiro/12 | - Início da 3ª e última fase da pesquisa: Leitura de textos de Hesse pós 1919, incluindo agora também Sidarta, a fim de indicar em que medida a trajetória de crise existencial também está expressa como diagnóstico da crise da cultura no pós 1ª guerra mundial; |
Março/12 | - Continuação da leitura e análise do diagnóstico da crise da cultura feita por Hesse, através dos textos pós 1919. |
Abril/12 | - Relacionar os aspectos existenciais da vivência da crise, com o diagnóstico da crise da cultura; |
Maio/12 | - Preparação do trabalho final do Pibic. |
Junho/12 | - Continuação da escrita do trabalho final do Pibic. - Apresentação prévia do trabalho final no Grupo de Pesquisa Nietzsche da PUCPR. |
Julho/12 | Conclusão dos trabalhos e discussão de novas perspectivas de pesquisa. |